Idade Gestacional: 40+5
Tudo começou quando na quinta recebi uma mensagem que a gestante estava perdendo o tampão e um pouco de liquido, a tranqüilizei pois o tampão pode se regenerar e pedi para que me deixasse informada conforme fosse evoluindo..
No domingo recebi uma ligação, as 5:40 da manhã que a gestante já estava no hospital (pensei: why God? Why???? Pq ela não me ligou antes???) e como ela estava com bolsa rota [gente, não era uma bolsa super rota, só estava molhando a calcinha e a literatura científica fala que NÃO HÁ PRAZO DE TEMPO DETERMINADO para o parto após o rompimento da bolsa se a mãe e o bebê estiverem bem, só é necessário muita hidratação], por estar com a bolsa rota há mais de 12h o hospital não a liberou mais para voltar para a casa, prescreveram um antibiótico (penicilina) de 4h em 4h e começaram a indução com o miso as 07:20 da manhã, e eu cheguei logo em seguida, nisso já haviam feito vááários toques (o que deve ser evitado ao MÁXIMO em caso de bolsa rota) para constatar que havia 1 cm de dilatação. Fiquei com ela, massageei os pés e caprichei no ponto que ajuda a aumentar as contrações (4 dedos acima do ossinho do pé), caminhamos muito e conversamos bastante. De 1h em 1h ia um aluno diferente auscultar o coraçãozinho do bebê. As 11h colocaram outro miso e aproveitaram para fazer outro toque que constatou 2 cm... fiquei até as 13h com ela, me despedi e disse que voltaria mais tarde, pois queria estar 100% para quando viessem as dores (até então ela sentia apenas contrações indolores) . Voltei as 15:30 e nem chegaram a colocar outro comprimido pois o TP havia pegado (eeee!!! Quase não acreditei!!!), as dores começaram e para piorar a situação ela estava presa a cama pois estava com o antibiótico na veia praticamente o tempo todo. Levei ela para tomar um banho e fiz massagem nas costas para relaxar, ela disse que o banho a fez sentir mais dores então saímos, nisso fizeram mais um toque e deu.. 3cm... coitada, foi um banho de água fria pois estava sentindo muita dor, já estava muito cansada (acordada desde as 2:30 da manhã) e conforme a dor foi apertando, sentiu muita ânsia de vomito e por fim vomitou várias vezes o que a deixou mais fraca do que estava.. entre tudo isso que compartilho aqui, tentei tornar o ambiente mais agradável desde o início, coloquei músicas para que não se ouvisse o barulho do hospital, apaguei a luz e deixei um abajur de canto que deixava o ambiente sereno, mas havia um problema, na verdade um problemão chamado Pai. Sim, acredito que neste caso o pai atrasou e muito o trabalho de parto desta mulher, o pai simplesmente não parava de contar desde que horas ele estava lá no hospital, não parava de tagarelar, atender 254854 ligações dos parentes querendo saber a cada minuto o que estava acontecendo, fazer piadas com a equipe médica enquanto a mulher sentia dores de parto, tentei por diversas vezes dar toques sutis como “dentro da barriga não tem relógio, quem vai decidir a hora certa é a bebê”, “agora é hora de fazer silêncio para que a mãe se concentre e seja tudo mais rápido” mas não, ele definitivamente não sabia a hora de se calar. Eu via uma mulher na porta da partolândia e um marido a puxando dalí, que triste.. esta mulher também tinha dificuldades por si só de se deixar levar, tive a impressão de que ela não estava muito a vontade comigo, mas cheguei a conclusão que ela simplesmente não queria se entregar.. muito provavelmente algo não resolvido na sua própria vida a atrapalhou ali. Quando foi 20:30 mais ou menos, ela sentia muitas dores mas eu via nos seus olhos que estava tentando ser forte, muito leoa mesmo. Mas aí começou o Pai a dizer: “Eu conheço ela, ela não está mais agüentando” “Você não quer uma anestesia?” “Doula, você não acha que já está na hora de uma anestesia?” Eu GRITEI internamente. Poxa vida, se a mulher estiver no seu limite, ela VAI dizer, acredite. Falei isso diversas vezes, por fim o Pai disse a ela que fizesse mais um toque e se estivesse longe de acabar que fizesse a anestesia. Tocaram e constataram... 5cm, foi a sua sentença para a anestesia a esse ponto o Pai insistiu tanto que ela consentiu chorando fazer, mas ao mesmo tempo dizia que não queria pois tinha medo da bebê nascer “molinha”, meu olhos se encheram de lágrima, mas eu tenho certeza que fiz tudo que pude pra não chegar neste momento e acredito que sem aquele Pai poderíamos ter chegado lá do jeito que ela havia planejado, totalmente natural... no que ela foi pra anestesiar, fui para a casa novamente pois já era 22hs eu estava acabada emocionalmente e com muita fome, achei que ela iria dormir com a anestesia e fui. Quando foi meia noite o marido me ligou “ela já está com dilatação total e sentada na banqueta” pensei comigo “WHAAAAAT???” , cheguei lá na velocidade da luz (da maternidade a minha casa são 30 minutos sem transito, fiz em 15 minutos) e ao entrar no quarto entendi tamanha rapidez da dilatação: ocitocina na veia. Descobri que a Maternidade “Tipo Humanizada”em que estávamos tinha esse costume, aplicar analgesia e logo em seguida a ocitocina. Nesse momento ela estava com muitas dores mas não sentia os puxos por causa da anestesia, mas ela dizia que quando fazia força durante as contrações, que a dor aliviava. O relógio bateu 1:00 da manhã e ela quis trocar de posição para ver se melhorava, ficou de quatro mas não aliviou, por fim a fizeram deitar de novo na cama para auscultar o bebê e tocar (de novo!!!), levantamos a cama para que ela não ficasse na posição ginecológica e nisso viram que o bebê já estava bem baixo nesse momento a equipe a perguntou se queria a episio (ufa!! que bom que perguntaram antes) ela recusou, foi entrando bastante gente no quarto para arrumar as coisas e eu torcendo para eles irem embora, só que não. Contei 8 infelizes dentro do quarto pois é claro que é muito agradável 8 pessoas assistirem você toda exposta urrando de dor. Nesse momento percebi que quem iria fazer o parto era uma aluna, auxiliada pela residente, pensei “que m***” e não podia dar outra, dirigiu o puxo o tempo todo (ainda bem que só na contração), ficou mexendo na vagina o tempo todo (eu queria ter feito o mesmo na dela, só pra ela ver o quão desagradável é) e eu só lembrava da nossa querida Melânia dizendo HANDS OFF, e também de um post recente dela recente dando dicas valiosíssimas do que o médico pode fazer na hora do expulsivo: sentar na mão, entrar no facebook, tricotar, jogar CandyCrush e afins. Sábia essa Melânia. Nessa hora uma querida buscou um espelho para ela ver o baby nascer, até que enfim alguém fez algo humano em prol dessa mulher. As 2:00 da manhã vimos a cabecinha da bebê, tinha uma circular de cordão ao invés da aluna deixar o bebê nascer em paz, não.. cortaram o elo de 9 meses do bebe com sua mãe com a alegação de que “não nasceria assim” sendo que nem esperaram a próxima empurrada pra ver o que iria acontecer. Na próxima empurrada (entre 2:05 e 2:10) nasceu uma princesa super saudável não vi o apgar, mas com certeza alto. Nisso não deram pra mãe enquanto não limparam, pesaram, mediram a cabeça, mediram o corpo, aspiraram e todo aquele blá blá protocolo blá blá que eles tem. Deram o bebê no colinho da mãe, tirei o avental dela para permitir um contato pele a pele e sugeri que desse o peito, o bebê sugava com muita força, mas o leite ainda estava pouco para toda a vontade do baby. Saldo final: Uma baby girl com 3.340 kg, uma laceração de 1º grau (3 pontinhos) e um pá na cara daqueles que ainda usam a episio.
E assim finalizo o relato de parto sob a ótica de uma doula voluntária (faço com amor e não nego), e assim é nascer no Brasil em uma Maternidade “Tipo Humanizada”.